Mesas redondas no 2º Encontro Anual da Rede CpE debatem a efetividade de simplesmente aumentar oferta de vagas em creches e propõe mais atenção na formação de professores
Vários estudos apontam a importância da pré-escola no desenvolvimento infantil e cada vez mais os governos no país dão atenção ao tema aumentando a oferta de vagas em creches e na educação infantil. Mas será que lotar as escolas de crianças realmente traz benefícios? Esse foi um dos temas de discussão no segundo dia do 2° Encontro Anual da Rede Nacional de Ciência para Educação (CpE).
A provocação veio do mediador do debate, o economista e professor da Universidade de São Paulo (USP) Daniel Santos, que questiona se a quantidade não está ocultando um problema de qualidade.Para ele, nem toda vaga é boa para a criança. Uma oferta de vaga de má qualidade pode ser mais prejudicial que benéfico.
“Quanto antes o aluno entra na pré-escola, melhor é a promoção das competências, devido à maleabilidade do cérebro neste momento da vida”, explica o professor. “O Brasil colocou a educação infantil como um investimento por termos evidências científicas de que quanto antes investirmos, maior é o retorno. Mas, nesse mundo de vagas abertas, não podemos comemorar tudo: salas superlotadas, sem espaços para interações de forma correta e brincadeiras… falta discutirmos a qualidade dessas escolas”.
Santos destacou alguns pontos fundamentais para que a pré-escola realmente traga benefício no desenvolvimento de competências para as crianças: brincar como forma de aprender, dar oportunidades iguais de aprendizado, ter professores com olhar atento para as necessidades individuais de cada aluno, desafios adequados para cada idade (nem fácil demais, nem difícil) e uma proposta pedagógica que não trabalhar só com questões fechadas, mas abertas também para ampliar o repertório.
Benefícios da pré-escola
A mesa contou ainda com as psicólogas Jane Correa, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e Maria Beatriz Linhares, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP. As pesquisadoras apresentaram dados de diversos estudos que mostram um melhor desenvolvimento cognitivo e socioemocional nas pessoas que frequentaram a pré-escola.
O desenvolvimento dessas crianças não se deu apenas nos anos seguintes à educação infantil, mas seguiu por toda a vida escolar. “Quanto maior o tempo na pré-escola, maior a capacidade de aprendizagem e desenvolvimento social”, explicou Correa. “Parte importante dessa fase é a interação compreensiva e afetuosa, além da qualidade dessas interações, tanto entre pares como entre o adulto [professor] e a criança”.
Segundo Linhares, “precisamos investir em todas as etapas, mas é inegociável investir na base, na primeira infância, porque é onde estamos perdendo desenvolvimento. Estamos perdendo a oportunidade de a criança desenvolver todo o seu potencial”.
Papel dos educadores
Ambas as psicólogas defenderam que é importante pensar no educador para que as interações nessa fase sejam feitas de forma correta. “A qualificação do professor é que vai dar a capacidade de desenvolvimento desses alunos”, explica Linhares.
A formação dos docentes também foi tema de uma mesa-redonda mediada pelo cientista social e professor da UFRJ Marcio da Costa. A questão principal foi uma pergunta: a universidade precisa se reinventar? A resposta unânime dos participantes foi que sim, sem nenhuma dúvida.
A pedagoga Nilma Fontanive, coordenadora do Centro de Avaliação da Fundação Cesgranrio e membro do Conselho Nacional de Educação, defendeu a criação de institutos de formação de professores ou de modelos integrativos para licenciaturas e bacharelados.
“Infelizmente, muitos professores saem da faculdade sem estar completamente aptos a dar aulas por falta do suporte adequado”, disse. “Atualmente, temos o ensino à distância, por exemplo, que é frequentado geralmente por pessoas mais velhas e que já têm alguma ocupação. O maior desafio nesse caso é como conciliar as aulas com o estágio ou prática pedagógica, que são extremamente necessários e que a gente postula que se inicie já no primeiro ano.”
Além disso, ela acredita que o modelo ideal seria dar autonomia aos poucos aos formandos, se inspirando na residência médica, onde o aluno começa a prática com um supervisor, antes de se formar.
Já o médico e professor da Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP) Naomar de Almeida, que também participou do debate, apostou na inovação: “é necessário um conjunto de ações, mas a chave está na inovação, tanto das estruturas e quanto dos processos da docência”.
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