Nossa pesquisadora Grace Schenatto explica como suas pesquisas com animais dão pistas do que acontece no cérebro quando estamos isolados e dá dicas para prevenir os impactos negativos

 

Durante a pandemia do novo coronavírus, COVID-19, o que mais temos escutado nos meios de comunicação são as palavras: isolamento social. Isso porque a melhor forma de diminuir a velocidade de propagação do vírus é evitar a aglomeração de pessoas. Mas não tem sido fácil manter o isolamento ou distanciamento social e uma das razões para isso é que somos uma espécie social. Ao longo do processo evolutivo, desenvolvemos um conjunto de habilidades que nos permitem fazer inferências sobre o que está acontecendo com outras pessoas: suas intenções, sentimentos, emoções e pensamentos. Ou seja, temos todo um aparato biológico dedicado à nossa cognição social. Então, ficar sozinho nem sempre é prazeroso. De fato, interações sociais ativam áreas do cérebro ligadas ao sistema de recompensa, àquele que quando ativado dá uma sensação de prazer.  Mas quais seriam os efeitos deste isolamento social? 

Há anos pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento vêm buscando as respostas para esta pergunta. Especificamente em neurobiologia, existe uma gama de estudos mostrando os efeitos do isolamento social na estrutura e na função cerebral, e as maneiras de amenizar estes efeitos. 

Assim como os humanos, os camundongos são seres sociáveis e utilizam a formação de grupos para se defender de predadores e facilitar a reprodução e a busca por alimentos. Em nosso laboratório, submetemos camundongos adultos a isolamento físico e completo, ou seja, os animais ficam sozinhos em suas caixas, por uma semana. Uma semana na vida de um camundongo corresponde a aproximadamente seis meses na vida de um ser humano.

O que aconteceu com o cérebro destes animais? Observamos uma diminuição na produção de mensageiros químicos, os chamados neurotransmissores, bulbo olfatório e no hipocampo, uma área importante para a memória. Estas alterações foram acompanhadas do aparecimento de comportamentos do tipo depressivo e ansioso, além de prejuízos de memória. Também detectamos um comprometimento na comunicação entre estas áreas cerebrais no momento em que os animais isolados encontram um outro animal que eles já conhecem. Resumindo, ficar isolado não é inócuo para o cérebro. 

Ambientes enriquecidos promovem a geração de novos neurônios em ratos em isolamento social, revertendo os efeitos deletérios de estar sozinho. (foto: Lara Mansk)

Mas e quando o isolamento social é inevitável? Existem maneiras de prevenir os prejuízos causados pelo isolamento social? Em nossas pesquisas mostramos que se o isolamento social ocorrer num ambiente enriquecido — no caso dos ratos com brinquedos e distrções — ou concomitante ao tratamento com o antidepressivo fluoxetina, os efeitos deletérios do isolamento social não aparecem. Tanto o ambiente enriquecido quanto o medicamento provocam a produção de novas células nervosas, os neurônios, no hipocampo. 

Como evitar esses prejuízos?

Muito da nossa cognição social emerge de mecanismos biológicos compartilhados com outras espécies de mamíferos. Por isso, as pesquisas no campo da ciência básica, que desvendam o que acontece com o cérebro e buscam alternativas que amenizem os efeitos do isolamento, são extremamente válidas. No atual cenário de pandemia que estamos vivendo, onde o isolamento social é necessário, siga o exemplo dos camundongos e enriqueça seu ambiente diariamente.

Em humanos, enriquecer o ambiente significa incluir no dia a dia atividades como ouvir música, tocar um instrumento, fazer uma leitura ou desenvolver habilidades manuais, como o artesanato. A prática de exercícios físicos também enriquece o ambiente, além de ser muito eficiente na produção de novos neurônios no hipocampo. Se estes métodos não forem suficientes, o tratamento farmacológico com antidepressivos, neste caso sempre com acompanhamento médico, também pode ser um aliado para prevenir os prejuízos cognitivos causados pelo isolamento social.

 

Sugestões para Leitura

Almeida-Santos, A.F., Carvalho, V.R., Jaimes, L. et al. Social isolation impairs the persistence of social recognition memory by disturbing the glutamatergic tonus and the olfactory bulb-dorsal hippocampus coupling. Sci Rep 9, 473 (2019). https://doi.org/10.1038/s41598-018-36871-6

Guarnieri, L.O., Pereira-Caixeta, A.R., Medeiros, D.C. et al. Pro-neurogenic effect of fluoxetine in the olfactory bulb is concomitant to improvements in social memory and depressive-like behavior of socially isolated mice. Transl Psychiatry 10, 33 (2020). https://doi.org/10.1038/s41398-020-0701-5

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