Crianças com Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) têm dificuldade de concentração, foco e espera. Mas o que causa esse problema? Cientistas têm tentado responder a esta pergunta por muito tempo. Um estudo recente de pesquisadores brasileiros associados da Rede CpE, agora republicado em formato para crianças na Frontiers for Young Minds, olhou para o cérebro de jovens com TDAH em busca da resposta e identificou que uma área do órgão, o striatum, não mostra muita atividade quando existe o indicativo de uma situação de recompensa por vir.
Normalmente, quando vamos receber algo bom, uma recompensa, nosso cérebro se prepara para esperar e focar, mesmo durante tarefas chatas. Isso pode ocorrer em diversas situações, como, por exemplo, quando o aluno foca para fazer uma tarefa da escola em troca de uma boa nota ou reconhecimento. Mesmo em animais esse sistema funciona na mesma forma. Um cão, por exemplo, espera paciente abanando o rabo por sua comida. O novo estudo mostra que nas pessoas com TDAH isso não ocorre da mesma forma. O sinais cerebrais de espera e foco são mais fracos, tornando a concentração mais difícil.
No experimento, os pesquisadores usaram ressonância magnética para ver a atividade cerebral de cerca e 30 jovens universitários com média de 23 anos, metade diagnosticada com TDAH e a outra metade não. Dentro da máquina de ressonância eles assistiram a uma série imagens intercaladas que mostravam um quadrado e um losango. Em algumas das aparições, após a imagem do losango uma jarra com moedas aparecia. Os voluntários foram comunicados de que ao final do experimento receberiam um vale-presente real para cada vez que vissem a imagem das moedas. Desse modo, os voluntários associariam a imagem do losango, prévia à imagem das moedas, ao anúncio de uma recompensa.
Ao analisar as imagens da ressonância, os cientistas viram que entre os estudantes sem TDAH, o striatum se mostrou ativo quando viam o losango, ou seja, quando esperaram por uma recompensa. O mesmo não ocorreu entre os estudantes com TDAH. Nesse grupo, o striatum só mostrou atividade quando os voluntários viam a imagem das moedas em si, não para a imagem do losango, que antecipava a recompensa.
“O striatum dos voluntários com TDAH ficou ativo quando eles recebiam a recompensa e não quando esperaram por ela”, diz um dos autores do estudo, o neurocientista Jorge Moll Neto, pesquisador do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (IDOR) e associado da Rede CpE.
Os pesquisadores acreditam que isso se deve a uma deficiência na liberação de dopamina quando há “pistas” da recompensa. A dopamina é um neurotransmissor fundamental no mecanismo de recompensa cerebral. “Nas pessoas com TDAH o striatum pode não funcionar tão bem para ajudá-las a focar e esperar. Sem os sinais cerebrais de que algo bom está por vir, sem a antecipação da recompensa, é mais difícil fazer coisas desafiantes ou que não sejam tão interessantes”, explica outro autor do estudo, Paulo Mattos, também do IDOR e associado da Rede CpE. “As pessoas com TDAH então tendem a repetir comportamentos que as tragam a recompensa de imediato, o que pode gerar problemas no convívio social e na sala de aula.”
Mattos destaca que o principal impacto do estudo é mostrar que o TDAH é um transtorno real, com bases biológicas. “Nosso trabalho reforça o TDAH como um transtorno verdadeiro e não uma doença inventada, como muitas vezes ouvimos. As alterações encontradas estão presentes desde precocemente e com frequência adentram a vida adulta.”
Deixe um comentário