Por Leonor Scliar-Cabral

Universidade Federal de Santa Catarina
Pesquisadora associada à Rede CpE

Dados publicados no início de fevereiro indicam que o número de crianças entre seis e sete anos que não sabia ler ou escrever saltou de 1,4 milhão em 2019 para 2,3 milhões em 2021. Em porcentagens, o primeiro número representa 25,1% das crianças brasileiras na faixa etária mencionada, já o segundo, 40,8%. Os dados estão em sintonia com avaliações nacionais anteriores, com a Avaliação Nacional de alfabetização (ANA) de 2016, o Indicador de Alfabetismo Funcional (INAF) de 2018 e até avaliações internacionais, como o Programme for International Student Assessment (PISA) de 2018.

A ANA de 2016 (Inep, 2017) foi aplicada a mais de 2,1 milhões de alunos concluintes do 3º ano do ciclo de alfabetização de escolas públicas brasileiras. A avaliação acusou que somente 12,99% atingiram o nível desejável (4) em leitura e apenas 8,28%, o nível desejável (5) em escrita, demonstrando que muito mais do que 40,8% das crianças – ao término do ciclo de alfabetização – o final do 3º ano do ensino fundamental, não estavam aptas a compreender nem textos elementares e, muito menos, sequer a escrever uma frase legível.

Conforme o Boletim do INAF de 2018 revela (vide Tabela 1.), 29% dos brasileiros não tinham condições mínimas para exercer a cidadania; 34% o faziam de forma rudimentar e somente 12% estavam aptos a compreender os textos necessários ao exercício da cidadania de forma plena bem como para competir no mercado de trabalho.

Tabela 1. INAF: dados sobre alfabetismo funcional entre 2001/2 e 2018.

Fonte: INAF, 2018.

O PISA avalia a aprendizagem de estudantes na faixa dos quinze anos, em avaliações trienais, patrocinadas pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que abrangem três domínios: leitura, matemática e ciências. Dentre os 79 países avaliados, o Brasil alcançou o 57º lugar, em leitura, atingindo apenas 413 pontos (saiu-se ainda pior em matemática, ocupando o 70º lugar e em ciências, ficando em 64º). Comparativamente às avaliações anteriores do PISA, os resultados demonstram a estagnação dos alunos brasileiros.

Os dados alarmantes me motivaram a buscar as causas desse cenário e a principal está na aprendizagem inicial precária da leitura, na alfabetização sem as bases científicas, em virtude das políticas públicas de alfabetização errôneas que não se fundamentam nas ciências de ponta da linguagem verbal, a neurociência da leitura, a linguística, a psicolinguística e a neuropsicologia.

É necessário, então, reformular os fundamentos que balizam as metodologias da alfabetização, a formação continuada dos professores e a elaboração do material pedagógico. Depois de muita pesquisa, criei o Sistema Scliar de Alfabetização (SSA), validado em 2011. Caso deseje conhecer as aulas para a formação de alfabetizadores, acesse o link: https://vimeo.com/album/5300767 (Senha: SSA Leitura). Aqui, apresentarei resumidamente os principais fundamentos, primeiro, do SSA para a leitura:

  1. Descontinuidades entre o processamento verbal oral e o escrito: embora haja muitas haja muitas semelhanças, como, por exemplo, que, sem entrada de informação linguística em nossa memória, não é possível produzir uma mensagem, há muitas diferenças, sendo a principal, para a alfabetização, que a criança adquire sua língua oral de forma espontânea e compulsória, enquanto a língua escrita é aprendida de forma sistemática, através do ensino por professores muito bem preparados.
  2. Por que iniciar pela alfabetização para leitura? Conforme explicado, sem entrada de informação linguística em nossa memória, não é possível produzir uma mensagem: a criança precisa saber ler o que “escreveu” (em geral, o que fez foi desenhar o proprio nome).
  3. Reciclagem neural para automatizar o reconhecimento de quais, quantos e como se combinam os traços gráficos das letras do alfabeto latino: esse é o primeiro momento da alfabetização para a leitura, que detalharemos no artigo.
  4. Atribuição do acento de intensidade e reconhecimento do início e término das palavras e vocábulos átonos, na leitura: também detalhados no artigo.
  5. Por que não alfabetizar pelo nome das letras: derrubar um mito arraigado desde os primórdiosda alfabetização e defendido, até hoje, por muitos educadores tem sido a batalha mais difícil de vencer. Mas não se reconhece rapidamente a palavra escrita (e isso é condição para a leitura fluente e compreensiva), soletrando o nome das letras ce – é – erre – ce – a, ao deparar com a palavra CERCA (s.). Isso porque, se a criança foi bem alfabetizada, ela reconhecerá, não conscientemente, em milissegundos, os traços e as letras, bem como os valores, ou seja, os fonemas /s/, /e/, /r/, /k/, /a/ que os grafemas representam, “ouvindo” em sua mente a palavra (fala interior). Ao contrário, influenciada pelo nome das letras, ela “ouviria” (traduzo em escrita usual para lhes facilitar): ‘ceércea’. Mas ela nem chega até aí, porque, para reconhecer uma palavra escrita, vamos registrando numa memória temporária, a Memória de Trabalho, somente por milissegundos, o resultado do que processamos, por exemplo: ce é ceé. Quando a criança soletrar ‘erre’, ‘ceé’ já apagou na Memória de Trabalho.
  6. Letras e grafemas são extraídos de palavras de um texto que compõe o livro de histórias, Aventuras de Vivi: os grafemas só existem dentro de palavras, pois sua função é distinguir o significado entre palavras escritas. O trabalho de automatização de quais, quantos e como se combinam os traços das letras e de quais são os valores dos grafemas numa dada palavra tem como objetivo formar um leitor fluente que compreende os textos que circulam socialmente. Então, criei o livro Aventuras de Vivi, cujos capítulos a criança lê, no início, com ajuda do professor, até adquirir autonomia, adquirindo o gosto pela leitura. Apresento, resumidamente, os fundamentos do SSA para a escrita:
  7. Na alfabetização para a leitura, seu aluno já tem diante de si as letras, palavras e o texto e se trata de aprender a reconhecê-los. Para escrever, ele está diante de uma folha em branco! Terá que se valer de seu conhecimento prévio, principalmente, o que aprendeu na alfabetização para a leitura.
  8. Complexidade do processamento da escrita: Os processos envolvidos na produção verbal são de natureza muito mais complexa do que aqueles atrelados ao reconhecimento da informação verbal. Na recepção verbal, (leitura), o texto já está posto.
  9. Planejamento e Plano: Produzir um texto escrito, por mais simples que seja, compete a quem escreve. Isso implica planejar para o que estamos produzindo a mensagem (intenções pragmáticas e/ou situação retórica), o que vamos escrever (os conceitos essenciais) e como vamos escrever, pois há várias escolhas, ou seja, seleções a serem feitas, nas quais interferem muitos fatores determinantes, como: para quem escrevemos (público ou privado, status, nível cultural etc.), suporte utilizado (celular, computador, papel etc.).

Dessas variáveis dependem a escolha do gênero e do registro e o planejamento do texto, do qual emana o plano que orientará a ordem no encadeamento das ideias, mantendo a coerência ao escrever.

  • Nossa competência para compreender os textos escritos, é muito superior à necessária para os produzir: Você, por experiência própria, sabe que é capaz de compreender e ler, com prazer, um livro do Érico Veríssimo, ou um poema da Cecília Meireles. Isto não significa que seja capaz de escrever como esses dois autores, nem tal capacidade é necessária para compreendê-los.

A implicação pedagógica desse fato é a de que o nível de complexidade dos textos e até mesmo de certos tipos e gêneros que vão ser trabalhados em sala de aula com os alunos, não só porque lhe são necessários, mas porque estão também ao seu alcance cognitivo, deve ser adequado à faixa de seu desenvolvimento cognitivo.

  • Automatizar a codificação e a execução dos gestos motores; monitoria: Tais processos altamente criativos exigem, porém, a automatização, através de uma boa aprendizagem, dos processos mais baixos e instrumentais: a codificação dos fonemas em grafemas, uma vez que pensar as frases que vamos escrever depende do uso da ‘fala’ interior. Após a codificação, ocorre a execução pelos gestos manuais das letras, os quais podem ser manuscritos ou digitais. A última etapa é a monitoria ou revisão.

Detalho, a seguir, os fundamentos 3 e 4 do SSA para a leitura:

1º – O nível mais baixo do processamento da leitura, propriamente dita, é o do reconhecimento dos traços invariantes das letras (no nosso caso, do sistema latino). Os traços invariantes primários de tais letras são 8:   | O ɿ c U   ﬤ   ~  . Acrescem-se os traços:

– Posição da reta: vertical, horizontal ou inclinada (o da bengalinha, só na letra y):  | \ – (I V A Á  À); ɿ (n y).

– Quantidade de cada traço: 1, 2, 3, 4 ,5 ou 6 (Exs. I L Z F E É Ê).

– Tamanho diferente na mesma fonte (Ex. F).                                                  

– Ultrapassagem da linha de base imaginária, só nas minúsculas (um dos traços mais difíceis para a percepção do alfabetizando): g j p q y.

– Direção e como se combinam: à direita do eixo (b); à esquerda do eixo (d); vértice para baixo (V); vértice para cima: (A); bengalinha com abertura no topo, para a esquerda: (a); bengalinha com abertura no topo, para a direita: (f); bengalinha com abertura na base, para a direita: (t); bengalinha com abertura na base, para a esquerda: (J); semicírculo com abertura para a direita: (q); semicírculo ou metade de elipse com abertura para a esquerda: (b P);

 – Combinações topológicas: pequeno traço no topo, ou cortando um terço da bengalinha, ou a base do círculo, ou fazendo ângulo com o semicírculo: (r t Q G).

Nenhum dos traços gráficos invariantes das letras tem função de distinguir significados (ao contrário dos traços acústicos invariantes dos fonemas).

2º – Letra não é sinônimo de grafema: o reconhecimento de quais, quantos e como se combinam os traços de uma dada letra não depende da língua oral representada e, sim, do tipo de escrita adotado (latino, hebraico, árabe, cirílico etc.), mas o grafema representa o valor numa dada língua escrita: no português escrito, uma ou duas letras realizam o grafema, como na palavra ‘massa’, que tem cinco letras, mas só quatro grafemas; outro exemplo, a palavra ‘mate’, no português, significa um tipo de bebida, ou as formas verbais do verbo ‘matar’. No inglês, as mesmas letras formam a palavra ‘mate’, com o significado de ‘companheiro’, porém os grafemas têm valores distintos, basta dizer que o último grafema tem o valor de zero (não se pronuncia a vogal, como no português).

3º – Como os neurônios da visão, para reconhecerem o que veem, não foram programados para perceber diferenças de direção (quando se trata de uma xícara, tanto faz ela estar com a alça voltada para a esquerda, ou direita), os neurônios da leitura têm que aprender, adaptando-se, para reconhecer as letras do alfabeto, como a diferença entre b/d. Essa aprendizagem se chama reciclagem neuronal.

O SSA começa a alfabetização para a leitura, na 1ª Unidade, com o reconhecimento dos traços de duas letras de imprensa maiúsculas que não apresentam espelhamento com outras: I, O e com a consoante V que apresenta espelhamento na vertical com a letra A, além do número 1. As três letras foram extraídas das palavras-chave VIVI, OVO, que também serão trabalhadas.

Conforme os ensinamentos de Montessori, o professor instrui as crianças que têm diante de si a folha com as letras, palavras e número em tamanho maior, conforme o exemplo: “Vamos percorrer, com o dedo, de cima para baixo e de baixo para cima a letra” (Reciclagem Neuronal, aponte para V, na lousa, sem dizer o nome da letra).

O reconhecimento dos traços invariantes das letras independe das infinitas variantes em sua execução, como tamanho, caixa (MAIÚSCULA ou minúscula), fonte e estilo (imprensa, manuscrita, itálico, negrito ou sublinhado etc.), ou da posição ocupada na palavra, detalhes descartados para reconhecer de que letra se trata.

4º – Pode parecer, à primeira vista, que só nos preocupamos com processos automáticos: muita cautela! Você, ao responder à pergunta: “Qual a sobremesa que você quer, banana ou laranja?”, com: “Banana.”, não tem que pensar como terá que fechar firme os lábios e, simultaneamente, ao abri-los, para produzir a sílaba [ba], como deverá pressionar as pregas vocais para que vibrem. Esses gestos foram automatizados quando você adquiriu a sua linguagem verbal oral para liberar a sua mente para escolher o que dizer (processos criativos).

Na leitura, você não pode titubear, diante da palavra escrita ‘bota’, em dúvida, se não se trata de ‘dota’: a identificação das letras, dos grafemas e seus valores e da palavra tem que ser muito rápida, pois essa informação fica retida por brevíssimo tempo na memória de trabalho, mas suficiente, para você reconhecer toda a frase, atribuindo-lhe a entoação e, assim, permitindo a construção do sentido, objetivo da leitura. Portanto, a automatização, a reciclagem neuronal não são um um objetivo em si mesmas, mas o meio indispensável para liberar os leitores competentes para acionar os conhecimentos prévios em sua cognição e, assim, compreender os textos que circulam socialmente.

 Vou-me deter num fundamento da linguística, essencial a uma alfabetização exitosa. Em geral, quando os professores de português tratam de acentuação, só se preocupam com acentuação gráfica na produção escrita e lá vem a decoreba das regras de acentuação. Mas, aqui, vamos tratar de como, quando lemos, reconhecemos se uma palavra tem uma sílaba mais forte, ou mais intensa, os chamados vocábulos tônicos (todos os substantivos, verbos e adjetivos), ou não, os chamados vocábulos átonos: são sempre palavras gramaticais e, no português, na maioria, são monossílabos e alguns são dissílabos, por exemplo, ‘porque’.

Os monossílabos e dissílabos átonos, dentre os terminados por vogais orais, sempre escritos com as letras ‘a’, ‘e’, ‘o’ (s) discrepam do que sucede na fala, grudados ao vocábulo com sílaba de intensidade, tornando opacas suas fronteiras e sofrendo alterações como assimilações, ressilabações, por exemplo (adaptado, para legibilidade): os + olhos = zoio. Se, ao invés das letras ‘e’, ‘o’(s), ocorrerem ‘i’, ‘u’ (s), no final, o vocábulo é tônico. Ex.: “João te ama” vs. “João gosta de ti”.

Também vamos verificar em qual das três últimas sílabas cai o acento de intensidade, se na última (oxítonas), na penúltima (paroxítonas, as mais frequentes) ou na antepenúltima (proparoxítonas). É, então, que um dos fundamentos da linguística entra em jogo: “o nada também vale”, postulado pelo maior linguista do século XX, Ferdinand de Saussure, pois a regra de ouro da atribuição do acento de intensidade, quando se lê, ao padrão vocabular escrito do português é: as palavras paroxítonas terminadas pelas letras ‘a’, ‘e’, ‘o’, seguidas ou não de ‘s’, ou por ‘em’, ‘ens’, ‘am’ não levam acento gráfico, por serem as mais frequentes do português (excluem-se os vocábulos átonos, muito frequentes, pois não têm sílaba de intensidade).  Exs.: ‘casa’, ‘nomes’.

VALIDAÇÃO DO SISTEMA SCLIAR DE ALFABETIZAÇÃO

A fim de testar a validade do SSA, dois pesquisadores, Miriam Maia de Araújo Pereira e Lidiomar José Mascarello, aplicaram um experimento de intervenção, em 2011, entre alunos do 1º ano de duas escolas primárias privadas, com 16 alunos cada, no norte de Florianópolis, sendo um grupo experimental e outro controle.

Após sete meses de intervenção, que incluiu o treinamento do professor e o acompanhamento da turma uma vez por semana na população experimental, foi aplicada a bateria de Recepção e Produção da Linguagem de Scliar-Cabral em ambas as populações para verificar o efeito da aplicação do SSA. Dos 16 Ss do GE, 12 deles se alfabetizaram depois de sete meses de aplicação do SSA e apenas 4 não o conseguiram (um, depois de dois meses de aulas viajou e só retornou em outubro; o segundo só começou a frequentar a escola em abril (as classes tinham começado em fev. e as outras crianças já estavam bem adiantadas no SSA); os dois outros apresentaram problemas cognitivos e comportamentais que requeriam intervenção específica). Ao final do experimento, os 12 Ss que se alfabetizaram, estavam aptos a ler com fluência uma história que lhes foi apresentada pela primeira vez: seu desempenho foi filmado e gravado. Somente 1 S conseguiu ler com fluência no GC.

No teste de conversão grafema-fonema, usando o nível de confiança de 5% (α = 0.05), com o grau de liberdade (GL) 30, obteve-se um valor p de 0.01 como resultado de um teste t (amostras independentes e variâncias iguais). O efeito de tamanho foi grande, com um valor de 0.97, conforme o valor d de Cohen. Os resultados dos testes indicam que a intervenção com o SSA influenciou positivamente a alfabetização do GE.

A partir dos resultados da Avaliação Nacional de Alfabetização de 2016 (INEP, 2017), que avaliou mais de dois milhões de crianças do Ensino Fundamental (EF), ao término do 3º ano), em que Sergipe ocupou o último lugar em leitura (3,02%) e Alagoas,  o pior, em escrita, com apenas 1,68% e Sergipe se colocou em antepenúltimo lugar, com apenas 1,84%, nos níveis de maior proficiência), resolvi priorizar a aplicação do SSA nesses dois Estados, amostrados, respectivamente pelas Secretarias Municipais de Educação  de S. José da Laje, AL e Lagarto, SE (das quais apresentarei um relato mais pormenorizado nesse capítulo).

Na avaliação do desempenho em leitura da ANA de 2016, havia quatro níveis, sendo o 1, o mais baixo (praticamente iletrados) e o 4, o nível de competência desejável para uma criança de 8 anos, no final do 3º ano do EF. Comparem-se os resultados, com os da avaliação em três níveis, pelo Programa Mais Alfabetização (CAED, 2018), agora, ao término do 2º ano do EF, em crianças de 7 anos, nas duas escolas de Lagarto que adotaram o SSA, desde 2017:

Tabela 2. ANA, 2016 em Sergipe e Mais Alfabetização, 2018 em duas escolas de Lagarto, SE

Fontes: INEP, 2017; CAED, 2018.

As crianças lajenses avançaram em leitura: de somente 1,39% no nível desejável 4, mas 36,11% no nível 1, praticamente analfabetos, no 3º ano, conforme a ANA de 2016, pularam para 71%, no nível desejável 4, descendo a 9% no nível 1, no 2º ano (Programa Mais Alfabetização (PMALFA), 2019). Em escrita, somente 0,31% atingiu o nível desejável 5, mas 25,96%, no nível 1 (garatujas irreconhecíveis), conforme a ANA de 2016; pelo PMALFA de 2019 saltaram para o nível desejável 4, com 60%, descendo para 13% no nível 1.

Em 2019, todas os anos do EF, exceto o 1º, participaram do Simulado Acerta Brasil (SOMOS, 2019). Aplicaram-se dois simulados, um, como diagnóstico de entrada e outro final. Nesse, os alunos do 2º ano obtiveram 85.9% de acertos em matemática e 73.4% em língua portuguesa, segundo a Teoria Clássica de teste TCT.

CONCLUSÃO         

Apresentei os dados alarmantes recentes e das avaliações da ANA, do INAF e do PISA, que demonstram o fracasso das políticas públicas de alfabetização, em virtude de os responsáveis por essas políticas carecerem de fundamentação científica para orientar a formação dos educadores dos anos iniciais e os autores dos materiais para o aluno.

Dentre os fundamentos que estão ausentes das políticas públicas de alfabetização, discutidos no artigo, menciono as contribuições da neurociência da leitura, em especial, a reciclagem neuronal, o que impede aos professores terem clareza sobre trabalhar com as crianças o reconhecimento de quais, quantos e como se combinam os traços invariantes das letras. Esse fundamento exponencial não norteia e, muito menos é aplicado à metodologia proposta pela Política Nacional de Alfabetização, instituída pelo decreto de 11 de abril de 2019.

Outro fundamento ignorado é a distinção entre letra e grafema, sem o que, torna-se muito difícil desenvolver a consciência fonêmica.

Ignorar a distinção entre processos automáticos e criativos, uma das grandes contribuições da psicolinguística, conduz à distorção de menosprezar a necessária automatização do reconhecimento dos traços que distinguem as letras entre si, para uma leitura fluente, única forma de se chegar à compreensão textual, objetivo final da alfabetização para a leitura. O mesmo se pode dizer em relação à atribuição do acento para reconhecer a palavra escrita.

Qual o caminho? Os responsáveis pelas políticas públicas de alfabetização devem se apoiar nos fundamentos e metodologias das experiências que apresentam resultados positivos comprovados.  

Sugestões para Leitura

BRASIL. Decreto 9.765, de 11 de abril de 2019. Institui a Política Nacional de Alfabetização. Brasília, DF: Presidência da República, 2019. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Decreto/D9765.htm.

BRASIL, INEP. Sistema de avaliação da educação básica – Avaliação Nacional de Alfabetização. (2017). Disponível aqui.

GLOBO. Educação. 08/02/2022. Disponível em:https://g1.globo.com/educacao/noticia/2022/ 02/08/ numero-de-criancas-que-nao-aprenderam-a-ler-e-escrever-aumenta-na-pandemia-aponta-levantamento.ghtml?utm_source=meio&utm_medium=email.

DEHAENE, S. Os neurônios da leitura Como a ciência explica a nossa capacidade de ler. Trad. e supervisão: L. Scliar-Cabral. Porto Alegre: Penso, 2012, 374 p.

INAF. INAF Brasil 2018. Resultados preliminares. Disponível em:https://acao educativa.org.br/wp-content/uploads/2018/08/Inaf2018_Relat%C3%B3rio-Resultados-20Disponível em <https//:www.portal.inep.gov.br>

SAUSSURE, F. de. Cours de linguistique générale. Edição crítica por Tulio de Mauro. Paris: Payot, 1972, p.510.

SAUSSURE, F. de. Écrits de linguistique générale. Texto estabelecido e editado por S. Bouquet e R. Engler. Paris: Gallimard, 2002.

SCLIAR-CABRAL, L. Neuron Recycling for Learning the Alphabetic Principles. Folia Phoniatrica et Logopaedica (online), n. 66, v.1-2, p. 58-66, 2014. DOI: 0.1159/000363764

SCLIAR-CABRAL, L. Sistema Scliar de Alfabetização – Fundamentos. Florianópolis: Editora Lili, 2013.

SCLIAR-CABRAL , L. Sistema Scliar de Alfabetização – Roteiros para o professor: Módulo 1. Florianópolis: Editora Lili, 2018.

SCLIAR-CABRAL , L. Sistema Scliar de Alfabetização – Caderno de Atividades, Módulo 1, Leitura. Florianópolis: Editora Lili, 2020a.

SCLIAR-CABRAL , L. Aventuras de Vivi. Florianópolis: Editora Lili, 2020b.

STANOVICH, K. Towards an interactive compensatory model of individual differences in the development of reading fluency. Reading Research Quarterly, n. 16, v.1, p. 33-71, 1980.

 

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