Pesquisa sugere que falar mais de uma língua traz vantagem nas funções executivas

Crianças com transtorno do espectro autista geralmente têm dificuldade de trocar de uma tarefa para outra. Um estudo publicado na Child Development sugere que essa dificuldade é reduzida quando a criança é bilíngue.

Os pesquisadores chegaram a esta conclusão depois de analisar 40 crianças entre 6 e 9 anos, com e sem austismo, algumas bilíngues e outras não. Eles observaram a habilidade dessas crianças de mudar de tarefas em um teste de computador.

Na tela do computador, as crianças precisavam escolher objetos pela sua cor. Por exemplo, apareciam coelhos azuis e vermelhos bem como barcos azuis e vermelhos e elas deveriam selecionar apenas os azuis. Em seguida, elas tinham que selecionar os objetos pela forma e não mais pela cor. Por exemplo, apenas barcos independentemente da cor.

No grupo de crianças com espectro autista, eles observaram que aquelas que eram bilíngues tiveram um desempenho significativamente melhor que as demais, indicando que as funções executivas dessas crianças são mais desenvolvidas. Já em relação à memória de trabalho, não foram vistas diferenças entre as crianças com autismo bilíngues e monolíngues.

Para os pesquisadores, no entanto, ainda não está claro se a vantagem se dá apenas no ambiente de teste do computador ou se estende-se para tarefas da vida diária.

“Ainda precisamos de mais dados, mas nosso estudo parece sugerir que o biliguismo pode ser benéfico e o que temos visto muitas vezes são profissionais sugerindo que expor uma crinça com espectro autista a mais de um idioma poderia piorar duas dificuldades de linguagem”, comenta Ana Maria Gonzalez-Barrero, líder do estudo.

Os pesquisadores pretendem acompanhar as crianças da pesquisa por mais cinco anos para ver como a vantagem se traduz na rotina delas.

As vantagens cognitivas do bilinguismo são um assunto de debate e sem consenso na comunidade científica. A linguista e pesquisadora da Rede CpE Lilian Hubner (PUCRS) aponta que o debate é grande. “O bilinguismo é um dos fatores de reserva cognitiva e há uma grande discussão sobre se a vantagem bilíngue realmente existe”, diz. “Há muitas evidencias sobre a vantagem, mas um monte de estudos que não a demonstram.”

A especialista ressalta que o bilinguismo tem vários aspectos positivos, mas que não pode ser encarado como único ponto para melhoria de cognição.

“O bilinguismo desenvolve competências, amplia o vocabulário e traz consigo a cultura de uma outra língua, que aumenta a visão de mundo da criança”, pondera. “Mas é importante verificar se outras variáveis, também importantes, foram controladas no referido estudo e em outros que apontaram a vantagem de bilíngues sobre monolíngues. Dentre essas variáveis, estão nível sócio-cultural, escolaridade dos pais, hábitos de leitura e escrita dos pais e da criança, qualidade da escola em que as crianças estudam, ou seja há muitos fatores que podem levar a conclusão errônea de que o bilinguismo é que traz essa vantagem.”

Sobre o Autor

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Jornalista carioca guiada pela curiosidade e fascinada pela ciência. Especializada na cobertura de ciência, saúde, tecnologia e meio ambiente, atuou como repórter da Ciência Hoje durante maior parte de sua carreira. Na Rede CpE, toca a assessoria de imprensa e a produção de conteúdo.

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