É intuitivo pensar que a aprendizagem dá prazer, e que tanto melhor ela será quanto mais prazer nos der.

Isso significa que decorar é diferente de aprender, pelo menos porque não dá prazer. Mas será que esses processos podem ser seguidos pela atividade funcional no cérebro?

Esse foi o pressuposto em que se baseou uma equipe de pesquisadores canadenses da Universidade de Calgary, em artigo científico recente. O grupo quis avaliar a eficácia dos métodos de ensino de neuroanatomia que estavam sendo utilizados para universitários de ciências da saúde. Imaginem.

Se há conteúdo mais relacionado à chamada “decoreba” é a anatomia do cérebro, que os alunos até apelidam de “neurodecoreba”.

O objetivo era ensinar a anatomia dos 12 pares de nervos cranianos e acompanhar tudo pela atividade elétrica produzida no cérebro dos alunos.

Os estudantes recebiam retornos positivos ou negativos de um programa de computador, em função das respostas que davam para identificar os nervos em diagramas e fotos do cérebro.

A seguir, aulas sobre o assunto e atividades de laboratório com cérebros reais. E, ao final, novos testes online sobre os sintomas clínicos de lesões dos nervos. Um teste de retenção era aplicado 20 semanas depois dos exercícios de aprendizagem.

Ao longo desse processo, os pesquisadores registravam o eletroencefalograma (EEG) dos alunos. Quer dizer, buscavam os potenciais elétricos que indicam a atividade das áreas cerebrais.

No EEG, encontraram um potencial que aparecia especificamente em uma região do cérebro situada atrás da orelha, relacionada ao reconhecimento visual de imagens complexas.

Além dele, um outro que aparecia consistentemente bem no topo do crânio, uma região associada a sentimentos de prazer.

Bem, o potencial elétrico do reconhecimento visual era bem intenso no primeiro teste (imagens desconhecidas: que será que estou vendo?), diminuía a seguir (ah, são nervos cranianos) e se mantinha estável nos testes subsequentes.

O segundo potencial comportava-se da mesma forma: alto no primeiro teste (que barato, estou aprendendo!) e mais baixo nos testes subsequentes (já aprendi… perdeu a graça).

O que esse experimento indica? Primeiro, confirma que os potenciais registrados no eletroencefalograma são associados às operações mentais realizadas durante um processo de aprendizagem.

Segundo, revela que eles mostram um processo mais ativo de reconhecimento visual de objetos novos (os nervos cranianos) nas fases iniciais da aprendizagem, não tão necessário depois que os nervos eram “aprendidos”.

Em terceiro lugar, indicam também grande sensação de prazer no início do processo, com uma relativa diminuição depois: é o momento de aprender que dá prazer!

E, finalmente, os resultados se mantinham até mesmo após 20 semanas, o que indica o sucesso dos métodos de ensino empregados, com a estabilização da aprendizagem. A conclusão é que nada se aprende sem prazer. E decorar é chato.

 

Sobre o Autor

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Graduado em Medicina pela UFRJ, com Mestrado e o Doutorado no Instituto de Biofísica (UFRJ), e pós-doutoramento no Massachusetts Institute of Technology. É Professor Titular da UFRJ, Membro Titular da Academia Brasileira de Ciências, Pesquisador 1A do CNPq, e Cientista do Nosso Estado da FAPERJ. Na UFRJ, chefia o Laboratório de Neuroplasticidade do Instituto de Ciências Biomédicas. Possui numerosos trabalhos científicos sobre desenvolvimento, plasticidade e evolução do cérebro, bem como livros de divulgação da neurociência para adultos e crianças.

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